O CÉU É O MEU TETO,A TERRA É MINHA PÁTRIA,A LIBERDADE É A MINHA RELIGIÃO!

sábado, 7 de abril de 2012

MINHA HOMENAGEM AO DIA INTERNACIONAL DOS RHONS(CIGANOS)...OPHRÉ RHOMÁ!

Dia Internacional del Pueblo Gitano 2012
CARTAZ PUBLICADO NA PÁGINA DO SITE DA UNIÓN ROMANI(ESPANHA) 

FOTO DO PRIMEIRO CONGRESSO ROMANI(1971).

ESCOLHI TRÊS POEMAS DE CECILIA MEIRELES,POETISA BRASILEIRA DE ORIGEM CIGANA PARA HOMENAGEAR ESTE DIA!  


                                           MEMÓRIA


Minha família anda longe
contravos de circunstancias:
uns converteram-se em flores,
outros em pedra, água, líquen,
alguns, de tanta distância,
nem têm vestígios que indiquem
uma certa orientação.

Minha família anda longe,
- Na Terra, na Lua, em Marte
-uns dançando pelos ares,
outros perdidos no chão.

Tão longe, a minha família!
Tão dividida em pedaços!
Um pedaço em cada parte...
Pelas esquinas do tempo,
brincam meus irmãos antigos:
uns anjos, outros palhaços...
Seus vultos de labareda
rompem-se como retratos
feitos em papel de seda.
Vejo lábios, vejo braços,
- por um momento, persigo-os;
de repente os mais exatos,
perdem a sua exatidão.
Se falo, nada responde.
Depois, tudo vira vento,
e nem o meu pensamento
pode compreender por onde
passaram nem onde estão.

Minha família anda longe.
Mas eu sei reconhecê-la:
um cílio dentro do Oceano...
uma ruga num caminho
caída como pulseira,
um joelho em cima da espuma,
um movimento sozinho
aparecido na poeira...
Mas tudo vai sem nenhuma
noção de destino humano,
de humana recordação.

Minha família anda longe.
reflete-se em minha vida,
mas não acontece nada:
por mais que eu esteja lembrada,
ela se faz de esquecida:
não há comunicação!
Uns são nuvem, outros lesma...
Vejo as asas, sinto os passos
de meus anjos e palhaços,
numa ambígua trajetória
de que sou o espelho e a história.
Murmuro para mim mesma:
"É tudo imaginação!"

Mas sei que tudo é memória...


...................................................................................................
TRAZE-ME 

Traze-me um pouco das sombras serenas
que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
- vê que nem te peço alegria.
Traze-me um pouco da alvura dos luares 
que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
- vê que nem te peço ilusão.
Traze-me um pouco da tua lembrança,
aroma perdido, saudade da flor!
-Vê que nem te digo - esperança!
-Vê que nem sequer sonho - amor!






....................................................................................................


BAZAR

Panos flutuantes de todas as cores
às portas do vento, no umbral da tarde.

E olhos negros.

Jardins bordados: roupas, sandálias
como escrínios de seda para alfanges.

E negros olhos.

Molhos de penas de pavão. Colares de nardo
a morrerem do próprio perfume
entre tufos de fios de ouro.

E os delicadíssimos dedos.

Pratos de doces verdes e cor-de-rosa:
pistache, coco, amêndoa, gulab.

Lábios de veludo.

Caixas, bandejas, aguamanil, sineta,
e o mundo do bídri: noite de chumbo e lua.

E olhos negros. E negros olhos.

Pingentes, borlas, ébano e laca,
feltros vermelhos, pulseiras de mica,
filigranas de marfim e ar.

E os dedos delicadíssimos.

Cestos cheios de grãos. Frigideiras enormes.
Grandes colheres. Muita fumaça. Muitos pastéis.

Lábios de veludo.

Corolas de turbantes. Brinquedos. Tapetes.
O homem que cose à máquina, o que lê as Escrituras.

Olhos negros.

Portais encarnados, cor de mostarda, verdes.
Velhos ourives. Ai, Golconda!
E uma voz bordando músicas trêmulas.

Negros olhos.

Bigodes. Balanças. Barros, alumínios.
Muitas bicicletas: porém o passo rítmico das mulheres majestosas.

Aroma de fruta, incenso, flor, óleo fervente.

Sedas voando pelo céu.
E os nossos olhos. Os nossos ouvidos. Nossas mãos.
(Objetos banais.)

Cecília Meireles, in "Poemas escritos na Índia





Nenhum comentário: